As dislipidemias correspondem a um grupo de distúrbios caracterizados por alterações quantitativas ou qualitativas das lipoproteínas plasmáticas, incluindo colesterol, triglicerídeos e suas frações. Em outras palavras, tratam-se de desequilíbrios que refletem causas metabólicas, endócrinas, genéticas ou nutricionais. Por isso, estão fortemente associadas ao risco de desenvolvimento de doenças cardiovasculares ateroscleróticas.

De modo geral, o estudo das dislipidemias envolve compreender o metabolismo lipídico, identificar os tipos de alterações, avaliar os parâmetros laboratoriais e correlacionar os resultados com condições fisiopatológicas e clínicas subjacentes.

1. Metabolismo lipídico e lipoproteínas

O metabolismo lipídico é responsável pela síntese, transporte, distribuição e degradação de lipídios, especialmente colesterol e triglicerídeos. Estes lipídios circulam no plasma ligados a proteínas, formando lipoproteínas classificadas como:

  • Quilomícrons: transportam triglicerídeos dietéticos do intestino para tecidos periféricos.
  • VLDL (Very Low Density Lipoprotein): sintetizada pelo fígado, transporta triglicerídeos endógenos.
  • LDL (Low Density Lipoprotein): principal transportador de colesterol para tecidos; em excesso, está associado à aterosclerose.
  • HDL (High Density Lipoprotein): participa do transporte reverso do colesterol, removendo excesso do endotélio e tecidos periféricos.

Assim, o equilíbrio entre essas lipoproteínas garante a homeostase lipídica. Quando há alterações na quantidade ou funcionalidade das frações lipídicas, caracterizam-se as dislipidemias, que, por conseguinte, podem predispor a complicações cardiovasculares e metabólicas.

2. Classificação das dislipidemias

As dislipidemias podem ser classificadas em primárias, de origem genética, e secundárias, resultantes de condições clínicas ou fatores externos.

As primárias incluem distúrbios como a hipercolesterolemia familiar, decorrente de mutações em genes envolvidos no metabolismo do LDL, levando a níveis elevados desde cedo e risco aterosclerótico precoce.

As secundárias, por outro lado, estão associadas a condições como:

  • Endócrinas: diabetes mellitus, hipotireoidismo, síndrome nefrótica.
  • Hepáticas: esteatose hepática, colestase.
  • Nutricionais: dietas hipercalóricas, excesso de carboidratos simples e gorduras saturadas.
  • Farmacológicas: corticoides, anticoncepcionais orais, diuréticos.
  • Hábitos de vida: sedentarismo, obesidade, consumo excessivo de álcool.

Portanto, identificar a origem da dislipidemia é essencial para orientar decisões clínicas e determinar estratégias de manejo adequadas.

3. Parâmetros laboratoriais e interpretação clínica

O perfil lipídico básico inclui colesterol total, LDL, HDL, VLDL e triglicerídeos. Cada parâmetro fornece informações complementares sobre o estado metabólico. Entre eles:

  • LDL-colesterol: principal marcador aterogênico; níveis elevados, especialmente de partículas pequenas e densas, aumentam o risco de aterosclerose.
  • HDL-colesterol: promove transporte reverso do colesterol e possui propriedades antioxidantes; valores baixos indicam maior risco cardiovascular e disfunção endotelial.
  • Triglicerídeos: elevados em resistência insulínica, síndrome metabólica e esteatose hepática; aumentam risco pancreático quando muito altos.
  • Colesterol total: indicador global que deve ser interpretado juntamente com as frações lipídicas.

Contudo, a interpretação isolada dos valores laboratoriais pode ser enganosa. Dessa forma, é necessária a avaliação integrada dos parâmetros e de fatores fisiopatológicos que possam interferir nos resultados.

4. Marcadores avançados

Nos últimos anos, novos biomarcadores têm complementado o perfil lipídico tradicional, permitindo estratificação de risco mais precisa. Entre eles, destacam-se:

  • Apolipoproteína B (ApoB): reflete o número total de partículas aterogênicas.
  • Apolipoproteína A1 (ApoA1): principal componente protéico do HDL, indicador da capacidade de transporte reverso do colesterol.
  • Relação ApoB/ApoA1: índice de risco cardiovascular mais confiável do que o LDL isolado.
  • Lipoproteína(a) [Lp(a)]: fator genético e inflamatório independente que contribui para aterosclerose.

Assim, a análise detalhada dessas frações permite identificar pacientes com risco elevado mesmo quando os valores clássicos de colesterol estão dentro da faixa de referência.

5. Fisiopatologia e implicações clínicas

De modo silencioso, as dislipidemias podem evoluir para complicações graves, incluindo infarto agudo do miocárdio, acidente vascular cerebral e doença arterial periférica. A presença de partículas LDL oxidadas, inflamação vascular crônica e resistência insulínica favorece, portanto, o processo aterosclerótico.

Triglicerídeos elevados estão associados à síndrome metabólica e aumentam risco pancreático. Baixos níveis de HDL refletem perda da função protetora, enquanto alterações na Lp(a) ainda contribuem para agregação plaquetária e inflamação vascular.

Em síntese, o estudo detalhado das frações lipídicas, das dislipidemias primárias e secundárias e dos marcadores avançados fornece base sólida para compreender o risco cardiovascular e metabólico. Além disso, permite avaliação precisa de intervenções preventivas ou terapêuticas

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