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Detecção precoce do Alzheimer

A doença de Alzheimer representa a forma mais prevalente de demência em todo o mundo, afetando milhões de indivíduos e impondo um impacto significativo sobre pacientes, familiares e sistemas de saúde. Tradicionalmente, o diagnóstico definitivo da doença só é confirmado em fases avançadas, muitas vezes por exclusão, após a manifestação clara de déficits cognitivos, funcionais e comportamentais.

Entretanto, avanços recentes no campo dos biomarcadores têm apontado para a possibilidade de detecção precoce e não invasiva da doença de Alzheimer por meio de um simples exame de sangue. Essa abordagem representa uma mudança de paradigma na forma como a doença pode ser identificada e monitorada, abrindo caminhos promissores para intervenções mais eficazes e precoces.

A fisiopatologia da doença de Alzheimer: uma progressão silenciosa

A doença de Alzheimer é caracterizada, do ponto de vista neuropatológico, pelo acúmulo extracelular de placas de peptídeo beta-amiloide (Aβ) e pela formação intracelular de emaranhados neurofibrilares compostos por proteína tau hiperfosforilada. Tais alterações desencadeiam um processo de neurodegeneração progressiva, com perda sináptica, morte neuronal e comprometimento funcional de regiões como o hipocampo e o córtex cerebral.

Importante destacar que essas alterações moleculares precedem, em anos ou até décadas, o surgimento dos sintomas clínicos. Por esse motivo, a identificação precoce desses processos patológicos é fundamental para a implementação de estratégias terapêuticas que possam, ao menos, retardar o avanço da doença.

Biomarcadores sanguíneos: o futuro do diagnóstico precoce

A análise de biomarcadores no líquor (como Aβ42, proteína tau total e tau fosforilada) já é amplamente utilizada em protocolos diagnósticos em centros especializados. No entanto, esse método é limitado pelo caráter invasivo da punção lombar, pelo alto custo e pela baixa disponibilidade em muitos contextos clínicos.

A busca por biomarcadores plasmáticos capazes de refletir alterações neuropatológicas tem se intensificado nos últimos anos. Diversos estudos multicêntricos demonstraram resultados promissores, com destaque para os seguintes alvos moleculares:

  • Peptídeos beta-amiloide (Aβ42 e Aβ40)
    A diminuição da razão Aβ42/Aβ40 no plasma tem sido correlacionada com a deposição de placas amiloides no cérebro, detectada por PET-CT.
  • Tau fosforilada (p-tau181, p-tau217 e p-tau231)
    A dosagem de isoformas específicas de tau fosforilada no plasma tem apresentado alta sensibilidade e especificidade para a diferenciação entre Alzheimer e outras demências, sendo considerada atualmente um dos biomarcadores mais promissores.
  • Neurofilamento de cadeia leve (NfL)
    Embora não seja específico para Alzheimer, o aumento dos níveis plasmáticos de NfL reflete o grau de neurodegeneração e pode ser utilizado como marcador de progressão da doença.
  • Glial fibrillary acidic protein (GFAP)
    Indicador de ativação astrocitária, a GFAP tem sido estudada como um marcador complementar, especialmente em estágios pré-sintomáticos.

Esses biomarcadores têm sido incorporados a modelos diagnósticos que utilizam inteligência artificial e aprendizado de máquina para integrar dados laboratoriais, genéticos (como a presença do alelo APOE ε4) e de imagem, visando maior acurácia no diagnóstico precoce da doença de Alzheimer.

Vantagens e limitações da abordagem sanguínea

O uso de biomarcadores plasmáticos representa uma estratégia promissora, sobretudo por ser minimamente invasiva, mais acessível economicamente e viável para rastreamento populacional em larga escala. Essa abordagem permitiria identificar indivíduos em fase pré-clínica, possibilitando o acompanhamento longitudinal, a inclusão em ensaios clínicos e o início precoce de terapias modificadoras da doença, caso disponíveis.

Entretanto, ainda existem desafios importantes a serem superados. A padronização dos ensaios, a variabilidade interindividual e a influência de comorbidades sistêmicas na concentração plasmática dos biomarcadores são fatores que podem comprometer a acurácia dos resultados. Além disso, ainda há necessidade de validação desses marcadores em coortes populacionais diversas, com diferentes faixas etárias, etnias e condições clínicas associadas.

A incorporação de exames de sangue baseados em biomarcadores no protocolo de rastreio e diagnóstico da doença de Alzheimer representa uma das mais promissoras inovações na medicina contemporânea. A detecção precoce por meio de testes plasmáticos pode transformar a abordagem clínica da doença de Alzheimer, permitindo intervenções mais eficazes, planejamento terapêutico individualizado e, sobretudo, melhor qualidade de vida para os pacientes e seus cuidadores.

Embora ainda existam desafios técnicos e clínicos a serem vencidos, os avanços recentes reforçam a ideia de que a era da neurodiagnóstica acessível e precisa está se aproximando e os exames de sangue podem estar no centro dessa transformação.

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